sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

Nenhum deles se perpetua


Nenhum deles se perpetua, todos se vão, todos que por algum motivo deveriam ficar, todos que desejei que ficassem, a sensação é igual a de tentar segurar a água fechando punho, ela escorre entre os dedos e o que sobra são só vestígios de uma mão úmida.
Nos primeiros anos achei ser por culpa minha, o motivo era meu peso, era pesada demais, uma responsabilidade que não se pode ganhar, é a responsabilidade que tem que ser desejada no intimo, mas nunca fui, e me tornei o peso, e como tudo que se torna insuportável manter junto de sí durante a jornada deve ser abandonado, assim foi feito. Já na mocidade a virtude se tornou encantadora, mas o encanto não dura, a entrega da virtude desfez o encanto, como papel na água que se passa muito tempo imerso, ao toque das mãos se desfaz até não sobrar nada. E a quebra do encanto despedaça sonhos, doces sonhos colecionados durante o amadurecimento de um fruto e mortos quando este fruto se choca já podre contra o chão , por fim é a morte de inocentes para alimentar pecadores.
Anos passam, feridas se curam, mas cicatrizes diferentemente deles, elas se perpetuam, e ficam lá gravadas na pele e na alma, para nunca serem esquecidas, para sempre marcarem a partida de um e a chegada do próximo.
Quando o mar se faz em calmaria, talvez seja um convite a navegar, já sou pirata, uma vez pirata sempre pirata, neste momento era dona de um veleiro que abrigava minha vida, e toda vez que um ancoradouro se tornasse amargo, minha felicidade iria aportar em outro lugar. Já cansada de tabernáculos e prostíbulos, aportei em um porto idoso, que só abrigava velha casas, pedi abrigo em uma e fui acolhida, mas sempre tratada com forasteira, nem os braços que me acolheram na intimidade dos lençois frios conseguia me fazer ser parte dali, eu era tempestade daqueles dias, e naquela casa só se conhecia calmaria, era um mundo indefeso de mim, mas era eu que precisava de proteção, e tudo que encontrei foi o saber que ''a carência eterna cansa''.
Desesperadores são os dias de abandonos, dias ocos, dolorosos e apertados, rasgar a pele e a carne, proporcionar a dor no físico talvez acalme a dor dentro de mim, talvez liberte meus pulmões para que eu volte a respirar, para colar o meu mundo em pedaços e entender que tudo sou eu, eu sou o tudo, eu faço e desfaço.
Os anos me ensinaram que o mundo não está preparado para mim, um universo não pode caber dentro de um mundo, então contive meu universo, tentei ser o que achavam que eu deveria ser, quase me sufoquei para me manter assim, a ponto de desistir, achei ter encontrado o que procurava. Promessas de um homem, vida de um rapaz, colo de um pai, isso tudo para mim, desde que eu renunciasse quem eu era, jurando com uma mão no peito e outra sobre a biblia, me daria tudo o que eu perdi durante os anos de minha vida, tudo o que me era de direito, agora seria meu, feito por mim, com minhas mãos, desde que eu pagasse o preço. No momento em que assinei com meu sangue aqueles papéis, o teatro encenado para me enfeitiçar os olhos, pegou fogo, se queimou por inteiro e o que sobrou foram apenas cinzas e roxos no braço.
Recomeça desfaz toda a beleza, ja é meu conhecimento que tudo que toco, se estraga, que eu os assusto e destruo, por isso não se perpetuam ao meu lado. Nasci para ser só, pq as cicatrizes dessa jornada já são grandes demais e não as posso esconder, já me deformaram e não posso mais disfarçar, sou suja, egocêntrica, inconstante e meio desmedida.
Ainda me resta uma pequena esperança de mudar o meu trágico destino, dei ela a vc em um potinho frágil de vidro, te contei e mostrei a essência do que sou, para que nunca digas que menti, ludibriei ou ocultei algo. No dia que bendisse o teu leito, esvai minha ira do mundo no sal do teu suor, ignorei minha fragilidade tornado-a ilicita, e lhe pedi com carinho para libertar-me das dores, afugentar-me o frio, que em troca teria minha companhia e nada mais.
Agora eu preciso de vc para acalmar minha eterna fome pelo amor, para que me faça entender que preciso deixar quem eu era, e me transformar em quem eu sou, eu só preciso que vc sobreviva à mim pq sou eu quem não pode te perder.

Nenhum comentário: